quarta-feira, 21 de julho de 2010

Menina-música


A radiola do avô é tudo de que uma pessoa precisa para ser feliz, ela sabia. Era feita de giros, ritmos e tons. A vida inteira presa numa nota, sol. Gostava de fazer de conta que o tênis velho era sapatilha de bailarina e saía rodopiando pela sala, sob o olhar atento dela mesma, que era a mais cruel de todas as críticas. Repetia milhares de vezes a mesma coreografia até que estivesse satisfeita, o que raramente acontecia. A repetição, na verdade, foi o subterfúgio que encontrara para nunca parar. Carregava consigo uma certeza: é a música que desperta o lado bom das pessoas. Como se nada mais fosse capaz de fazer, dançava, desbravando o mundo com a ponta dos pés. Poesia feita com o corpo. Ela cheirava a música. Deve ser feitiço isso de ter a melodia como um pedaço da pele.

Um comentário: